Certa vez Jesus se encontrou com uma mulher samaritana junto ao poço de Jacó, e pediu-lhe água para beber. Tendo a mulher estranhado o pedido, o Senhor lhe disse: “Se conhecesses o dom de Deus…” (Jo 4,10). – Estas palavras despertam curiosidade e merecem ser analisadas.
A mulher não conhecia ou não sabia… Aliás nós todos, criaturas humanas, não conhecemos muita coisa…, mas podemos suspeitar que existe algo além do que conhecemos; muitas vezes podemos estar tratando com pessoas e coisas de grande valor sem nos dar conta disto; só após o evento terminado, é-nos dado tomar consciência de quanto era importante. No Evangelho citado, porém, Jesus se refere a um conhecimento que ninguém pode deixar de procurar adquirir: conhecimento do sentido da vida, do por que existo (de onde venho? Para onde vamos?); por isto explica à mulher: “Se conhecesses quem é que te fala, eu te daria água viva… Quem beber da água que eu lhe darei, nunca mais terá sede” (Jo 4,14). A água aí é imagem do Espírito Santo (cf. Jo 7,39) ou do próprio Deus, que se quer dar aos homens. É Santo Agostinho quem mais uma vez nos leva a pensar:
“Ele deu-te tudo, fez-te o que tu és. Dá os frutos da terra, as fontes, a vida, a saúde e todos os benefícios. Reserva para ti o que não dará senão a ti. E que é que te reserva senão Ele próprio? Deus reserva-Se a Si mesmo para ti” (Comentário do Sl 32).
É realmente espantosa esta afirmação de Santo Agostinho; quem ousaria dizer, por seu próprio raciocínio, que Deus mesmo quer ser o grande Dom para nós, geralmente mais interessados na criatura do que no Criador? Quem diria que, mesmo ao tratar das realidades comezinhas de nossa vida, estamos lidando com algo muito precioso, que exige de nós respeito e dedicação, tais como convêm a um(a) servidor(a) de Deus?
A época da Quaresma é o tempo propício para refletirmos sobre a temática. A Cruz e a Ressurreição vêm a ser o testemunho dessa entrega de Deus à sua criatura. A Grandeza desse dom exige uma resposta cada vez mais coerente e profunda, longe da superficialidade ou mesmo frivolidade a que nos atrai a nossa natureza lerda e resistente aos altos impulsos da graça.
Santa e feliz Páscoa é o que a todos desejamos.
Pe. Estêvão Bettencourt, OSB
Texto publicado na Revista Pergunte e Responderemos nº 549, Março/2008.