Jesus confiou aos seus discípulos a missão de ser sal da terra (Mt 5,13). Assim, usou uma imagem. Que significa ela?
– Na literatura clássica, o sal simboliza a sabedoria.
No contexto do Evangelho, pode-se dizer que a metáfora tem duplo sentido:
1) O sal conserva o alimento e impede-o de se deteriorar… Ora esta parece ser uma função primordial do cristão: guardar a Verdade e o Bem, preservando-os de se perverter. A mensagem do Evangelho é preciosa, mas não raro encontra oposição por parte da mentalidade do mundo dado ao hedonismo. Daí torna-se especialmente árdua a missão entregue por Jesus aos seus discípulos; as pesquisas de opinião por vezes manifestam correntes de pensamento favoráveis a comportamentos alheios ao Evangelho. O cristão então é tentado a crer que está defasado e deve adaptar-se ao voto da maioria, como se a Verdade e o Bem dependessem de plebiscito. Nessas horas toca ao cristão recordar-se das palavras de Jesus:“Se o sal perder o seu sabor, com que o salgarão? Servirá apenas para ser jogado fora e conculcado” (Mt 5,13). O papel do cristão arauto da mensagem evangélica pode ser penoso, mas é de nobreza singular e – diz Jesus – é único, insubstituível. Se o cristão falha na sua fidelidade à mensagem do Evangelho, deixa uma lacuna que ninguém poderá preencher. Trata-se de um serviço prestado aos irmãos, nem sempre devidamente entendido, mas altamente valioso.
2) O sal é chamado a dar um sabor novo à alimentação; sem sal a comida é insossa. A metáfora quer dizer que ao cristão toca também a tarefa de renovar a sociedade, comunicando-lhe os valores do Absoluto ou Definitivo. Estes não se opõem aos valores mundanos, mas enriquecem-nos e dão-lhes novo alcance. Muitas vezes a presença de um cristão fiel e santo estimula os irmãos e lhes abre os olhos para horizontes mais elevados. Dizia São Paulo, citando o escritor grego Menandro: “As más companhias corrompem os costumes” (1Cor 15,33). Analogamente a companhia dos santos pode, por graça de Deus, sanar os costumes. Sem alarde nem vozerio, o cristão autêntico e fiel beneficia sua sociedade. – Eis outra missão que pode custar sacrifícios, pois exige não pactuar com belas propostas dos maiorais deste mundo. Pode até implicar zombaria e escárnio para o irmão ou a irmã fiel, mas é tarefa valiosa: quem a trai por covardia ou displicência, deixa uma lacuna que ninguém poderá preencher.
Parece que os tempos atuais, em que tanto se fala de corrupção na vida pública, vêm a ser um sinal eloquente que faz ressoar aos ouvidos do cristão, ainda com mais insistência, as palavras do Senhor Jesus.
“Se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações…” (Sl 95,7).
Pe. Estêvão Bettencourt, OSB
Texto publicado na Revista Pergunte e Responderemos nº 470, Julho/2001.