1ª Leitura: Is 60,1-6
Sl 71 (72)
2ª Leitura: Ef 3,2-3a.5-6
Evangelho: Mt 2,1-12
“Os povos caminham à tua luz e os reis ao clarão de tua aurora” (Is 60,3)
Muito poderíamos dizer a respeito do Mistério desta Solenidade que hoje celebramos. Sobretudo, porque somos colocados diante da rica e abundante Palavra de Deus, que hoje nos ilumina e nos introduz neste divino mistério que celebramos conjuntamente com a Igreja Celeste, cuja “lâmpada é o Cordeiro”.
Cabe-nos, em primeiro lugar, destacar a origem e o sentido da solenidade que hoje celebramos. A festa da Epifania surgiu no Oriente, mais ou menos no mesmo período em que surgiu o Natal no Ocidente. As duas festas são aparentadas, porque na sua origem eram destinadas a celebrar o mesmo mistério: o nascimento do Salvador em nossa carne mortal.
Quando a festa da Epifania foi introduzida no Ocidente cristão, conservou-se apenas uma parte do seu sentido originário, ou seja, a “manifestação de Cristo aos povos pagãos”. Da mesma forma, quando a festa do Natal foi introduzida no Oriente, a festa da Epifania foi sendo aos poucos entendida também somente como a celebração da manifestação de Cristo às nações. Hoje, para nós, o Natal celebra e atualiza o nascimento, enquanto a Epifania celebra e atualiza a manifestação do Cristo, que nasceu em Belém, aos gentios, que são representados nestes magos que visitam o Menino-Deus no presépio.
O Evangelho que ouvimos nos coloca diante da cena dos magos que vêm do oriente para adorar o Senhor. Guiados por um astro misterioso, são levados em direção ao “Astro que nasce das alturas” (cf. Lc 1,78), em direção Àquele que veio “para iluminar os que jazem nas trevas e na sombra da morte” (Lc 1,79). Chegando à Herodes, interrogam pelo Messias. Herodes teme perder o seu trono e planeja antecipar aquilo o que será por outros realizado, a Páscoa do Salvador. Como fala São Leão Magno em seu primeiro sermão sobre a Epifania “O Senhor do universo não procura um reino temporal, ele que dá um reino eterno.” E ainda comentando sobre o desejo que nutre Herodes de matar aquele que, embora sendo seu Salvador, ele considera como adversário, diz: “Aquele que nasceu quando quis, morrerá conforme a livre disposição da sua vontade.” De fato, como nos ensina São João, ninguém tira a sua vida, mas Ele a dá livremente.
Os sumos sacerdotes e doutores da Lei orientam os magos a respeito do lugar onde deveria nascer o Messias: em Belém. Os mestres da Lei a lêem sem compreendê-la. Eles possuem um véu no coração (2Cor 3,15). Orientam os magos, mas não sabem orientar a si mesmos. E os magos, guiados pela estrela e pela palavra da profecia chegam até o Messias, e oferecem seus presentes, que são, segundo o mesmo São Leão, “sacramento da sua fé e da sua inteligência”: ouro, porque Ele é o Rei dos Reis; incenso, porque Ele é verdadeiro Deus; mirra, porque se fez verdadeiramente homem e morrerá para a nossa salvação. Aquilo o que compreendemos pela fé está presente de forma sacramental no presente dos magos: Este menino que nasceu em Belém é homem e é Deus; assumiu a nossa humanidade, sem nada perder da sua divindade; Ele é verdadeiramente o Rei que devia vir ao mundo e reunir todas as nações, dos mais longínquos cantos do planeta, na Jerusalém nova que é a Igreja.
Deus que havia feito Aliança com Abraão e prometido a ele uma descendência numerosa, realiza agora a sua promessa, porque a verdadeira descendência de Abraão não é segundo a carne, mas segundo a fé, porque como nos ensina São Paulo, Abraão foi declarado justo em virtude da sua fé, porque Ele aceitou o convite de Deus e saiu da sua terra e da sua parentela e caminhou em direção à Terra da Promessa. Agora, no Verbo feito carne, a promessa que Deus havia feito a Abraão se realiza e todos são admitidos ao Novo Israel de Deus, a Igreja. Este é o “mistério” de Deus revelado a nós, como nos diz São Paulo na carta aos cristãos de Éfeso: “os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho.”
Isaías profetizou e nós vemos a sua profecia se cumprir. “Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor.” O profeta convida a cidade a colocar-se de pé, porque apareceu sobre ela o Senhor. A Igreja é a “nova Jerusalém”: apareceu sobre nós a glória do Senhor. Aquela glória transitória que aparecia a Moisés, na sarça, no Horeb e em tantas outras teofanias, agora se manifestou sobre nós.
Depois da sarça ardente e da nuvem que enchia a tenda da reunião, o que esperávamos? De certo não era um menino envolto em faixas. Mas Deus não entra na nossa lógica e o que pensávamos impossível aconteceu, ou melhor, o que nem podíamos cogitar aconteceu: Deus apareceu na nossa carne, a sua glória apareceu na nossa humanidade e nós que andávamos nas trevas fomos iluminados. Estávamos envolvidos nas trevas do pecado e a nossa humanidade foi preenchida pela luz da divindade que veio morar em nossa carne e nos “recriou na luz eterna de sua divindade” como nos ressalta hoje o prefácio da Epifania.
Enquanto vivemos neste mundo devemos refletir a luz d’Aquele que se manifestou a nós e nos iluminou. O profeta diz a respeito de Jerusalém que “os povos caminham à tua luz e os reis ao clarão de tua aurora.” A Igreja, qual nova Jerusalém, é chamada a ser para os homens deste mundo um sinal de luz. No meio de nós está aquele que é a própria luz, “Luz da Luz” como rezaremos no Credo. Iluminados por sua luz iluminemos os outros. Sejamos como a estrela que guiou os magos. Iluminada pela luz do Verdadeiro Astro, guiou-os até Aquele que era a fonte da sua luz. Que ao refletirmos a luz do Salvador feito homem que hoje se manifestou a todos os povos e a cada um de nós, que andávamos nas trevas, possamos atrair muitos, e que esses muitos se juntem a nós, para proclamarmos a glória do Senhor.