Is 60,1-6
Sl 71
Ef 3,2-3a.5-6
Mt 2,1-12
Vimos sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo (cf. Mt 2,2)
O termo “epifania” vem do grego e significa “manifestação/aparição”. Ele aparece em 2Tm 1,10: “Essa graça, que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos, foi manifestada agora pela Aparição (epifaneias) de nosso Salvador, o Cristo Jesus. Ele não só destruiu a morte, mas também fez brilhar a vida e a imortalidade pelo Evangelho… (cf. 2Tm 1,9b-10).
Na Solenidade da Epifania a Igreja celebra a manifestação, a revelação de Cristo às nações simbolizadas na figura dos magos vindos do Oriente para adorá-lo. É o que noz diz a oração coleta: Ó Deus, que hoje revelastes o vosso Filho às nações, guiando-as pela estrela, concedei aos vossos servos e servas que já vos conhecem pela fé, contemplar-vos um dia face a face no céu. Também São Leão Magno, no seu Sermão 3, Sobre a Epifania do Senhor, afirma “celebremos com alegria espiritual o dia das nossas primícias e do chamado dos primeiros povos pagãos à fé”.
Os textos bíblicos deste domingo nos colocam em contato com o anúncio e a concretização desse “mistério”. A primeira leitura, um trecho do chamado Trito-Isaías, a terceira parte do livro do profeta Isaías, é um convite a que Jerusalém “acenda as luzes” porque apareceu sobre ela a glória do Senhor. O profeta fala das trevas que envolviam a terra e das nuvens escuras que cobriam os povos. O termo para “trevas”[1] utilizado aqui é o mesmo que encontramos em Gn 1,2, que fala das “trevas que cobriam o abismo”. Assim, o profeta apresenta a situação de caos que será repentinamente transformada numa situação positiva, simbolizada pela luz que se acende.
Is 60,3 fala dos “povos” que caminharão à luz de Jerusalém. E aqui, para designar os “povos”, o profeta utiliza o termo gôyim que, na Escritura, designa, em geral, os povos pagãos. Todos virão, trarão ouro e incenso e proclamarão a glória do Senhor.
Esta profecia se realiza no texto do Evangelho proposto para este domingo. Guiados por uma estrela, alguns magos vêm do Oriente e adoram o Senhor. Estes magos simbolizam os povos pagãos, aqueles mesmos profetizados por Isaías, e que agora vêm, primeiro à Jerusalém e depois à Belém, para ver a “luz do alto” que havia nascido, o Cristo, Salvador, “sol nascente que nos veio visitar” (cf. Lc 1,78).
Estes magos oferecem a Cristo presentes ricos de simbolismo: ouro, incenso e mirra. Os padres da Igreja e, particularmente São Gregório Magno, reconhecem que estes presentes simbolizam a realeza de Cristo (ouro), a sua divindade (incenso) e o mistério da sua paixão (mirra[2]), pois este menino que nasceu em Belém deverá entregar-se à morte e ressuscitar pela nossa salvação. Realiza-se, assim, o que cantamos no refrão do Salmo Responsorial dessa liturgia: “As nações de toda a terra hão de adorar-vos, ó Senhor!”
O mistério predito por Isaías e realizado no Evangelho é aclamado por Paulo na segunda leitura. Paulo explica o que ele entende por “mistério”: Cristo veio para nos salvar e admitiu as nações pagãs à mesma herança reservada para o povo da primeira aliança. Esse é o “mistério” de Deus, oculto desde tempos remotos: o Cristo, que devia vir para nos salvar. Esse mistério ultrapassa em muito qualquer expectativa, também pelo fato de os pagãos serem admitidos à mesma herança a qual estava reservada para os filhos da promessa.
Diante da graça de Deus que vem ao nosso encontro, que envia seu Filho para ser o nosso Salvador e que admite à sua herança todos os homens, não somente o povo da primeira aliança, devemos render nossa ação de graças. Devemos, ainda, ao contemplar o Evangelho, colher dele elementos que nos ajudem a viver de modo cada vez mais autêntico nossa vida de cristãos. Podemos olhar a estrela e pensar que, assim como ela o fez, também nós devemos fazer: devemos guiar os homens até o Cristo. Devemos refletir o brilho da glória do Senhor e ser, no mundo, aqueles que apontam o caminho que a Ele conduz. Podemos olhar, ainda, a atitude dos magos, e pensar que, também nós, devemos oferecer a Deus nossos dons, e que dom maior podemos oferecer a Deus senão nossa própria vida, afinal nos diz São Paulo: “Exorto-vos, portanto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais vossos corpos como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus: este é o vosso culto espiritual” (cf. Rm 12,1).
O menino que nasceu em Belém não é um menino qualquer, é Deus, que se fez homem; é rei, que se fez humilde para nossa salvação; vai entregar-se à morte por nós, mas ressuscitará ao terceiro dia, a fim de termos, também nós, a certeza da ressurreição. Que nós o adoremos de todo o coração como o fizeram os magos. Que abramos o olhar de nossa fé para reconhecermos, no menino, aquele que é Rei e Senhor pelos séculos.
[1] O termo hosher.
[2] A mirra é uma erva aromática utilizada para embalsamar os corpos. Jo 19,39 fala que Nicodemos envolveu o corpo de Jesus com uma mistura de mirra e aloés antes de o sepultar.