1ª Leitura: At 1,1-11
Sl 46 (47)
2ª Leitura: Ef 1,17-23
Evangelho: Lc 24,46-53
“Hoje nosso Senhor Jesus Cristo subiu ao céu; suba também com ele o nosso coração.” (Santo Agostinho)
A Igreja celebra hoje a grande Solenidade da Ascensão do Senhor. O Senhor, após a sua Ressurreição, apareceu aos seus discípulos durante quarenta dias como nos dizem as Escrituras e, depois, disso, foi elevado à vista deles.
O trecho do Evangelho de Lucas desta solenidade nos apresenta a cena da Ascensão. O Senhor envia os seus apóstolos em missão e, logo depois, é elevado às alturas dos céus, onde está sentado à direita do Pai, conforme rezamos cada Domingo em nossa profissão de fé. Mas, ao ser elevado às alturas dos céus, ele não abandona os seus, porque o mesmo evangelho afirma que eles continuavam a ir sempre ao Templo para “bendizer a Deus”, e que eles voltaram a Jerusalém “com grande alegria”. O Senhor os alegrava interiormente. Essa alegria era já fruto da misteriosa presença do Cristo no meio dos seus.
Os apóstolos pregavam e o Senhor realizava por meio deles sinais que confirmavam a sua pregação. Esta mesma cena da Ascensão, nos é relatada na primeira leitura e no salmo. O Salmo 46 é quase como que uma profecia: “Por entre aclamações Deus se elevou, o Senhor subiu ao toque da trombeta”. A primeira leitura, por sua vez, o início dos Atos dos Apóstolos, nos apresenta o Cristo que “foi levado” aos céus, depois de ter dado instruções aos seus discípulos e de ter-lhes prometido o dom do Espírito Santo. A cena termina com os anjos, dois homens vestidos de branco, que interrogam os apóstolos sobre o porquê de estarem a olhar os céus, uma vez que o Cristo, do mesmo modo que foi, deveria também retornar para junto dos seus, na consumação dos tempos.
Da celebração desta Solenidade podemos tirar grandes lições para a nossa vida espiritual. Em primeiro lugar, esta solenidade reaviva em nós a virtude da esperança. Cremos e esperamos que, do mesmo modo como Cristo subiu e se assentou à direita do Pai, nós também nos sentaremos nos céus com o Senhor, depois de termos feito nossa “Páscoa”.
Aí está a nossa esperança, não numa vida boa e perfeita aqui, mas na vida eterna que o Senhor tem para nós. É o que nos diz a segunda leitura: “Que ele (o Pai) abra o vosso coração à sua luz, para que saibais qual a esperança que o seu chamamento vos dá, qual a riqueza da glória que está na vossa herança com os santos, e que imenso poder ele exerceu em favor de nós que cremos, de acordo com a sua ação e força onipotente.” (Ef 1,18-19)
São Leão Magno nos confirma nessa esperança cristã: “A ascensão de Cristo, portanto, é nossa exaltação e para lá onde precedeu a glória da Cabeça, é atraída também a esperança do Corpo.”[1] Crendo que estaremos com Cristo na sua glória, é dissipado de nosso coração todo medo e, da nossa mente, é tirada toda dúvida: “Estes dias, diletíssimos, que transcorreram entre a Ressurreição do Senhor e a sua Ascensão não se passaram na ociosidade; mas, neles foram confirmados grandes sacramentos e revelados grandes mistérios. Nestes dias foi abolido o medo da fúria da morte, e foi declarada a imortalidade não somente da alma, mas também do corpo.”[2]
A segunda lição diz respeito à nossa vida neste mundo. Se Cristo subiu às alturas celestes e se para lá nós também nos encaminhamos, devemos nos esforçar por levar uma vida nova. “Hoje nosso Senhor Jesus Cristo subiu ao céu; suba também com ele o nosso coração.”[3] Santo Agostinho diz que o nosso coração deve subir com Cristo. Também no início da Oração Eucarística somos exortados pelo que preside que nos diz “Corações ao alto” e nós respondemos “O nosso coração está em Deus”; sim o nosso coração está onde está Cristo, à direita do Pai, por isso devemos elevar até Ele o nosso desejo, devemos abandonar com o auxílio da força do seu Espírito a vida cá de baixo, para já começarmos a viver a vida lá de cima, onde deve estar o nosso coração e onde estaremos inteiramente presentes um dia.
A terceira lição que devemos tirar nesta solenidade é que o Cristo, subindo ao Pai, não se afastou de nós. Ele foi para junto do Pai, é o que nos revela a Palavra; Ele voltará um dia, é o que também nos garante a mesma Palavra que acabamos de ouvir; mas Ele está continuamente presente no meio de nós. Que Divino Mistério é esse? Ele foi, Ele voltará, mas está continuamente presente na sua Igreja. Santo Agostinho nos diz que Cristo está sempre no meio de nós, mesmo tendo já subido para o Pai, assim como Ele continuava presente no céu, mesmo estando ainda conosco na terra: “O Senhor Jesus Cristo não deixou o céu quando de lá desceu até nós; também não se afastou de nós quando subiu novamente ao céu.” (Santo Agostinho. Sermão Sobre a Ascensão. LH Vol. II, p. 829)
O mesmo Santo Agostinho, ao comentar o Salmo 46 que cantamos nesta liturgia da Palavra, nos assevera: “Corporalmente é arrebatado de vossos olhos, mas enquanto Deus não se separa de vossos corações. Vede-o a subir, acreditai no ausente, esperai o que há de voltar; por sua misericórdia oculta, contudo, percebei a sua presença. Aquele que subiu ao céu, furtando-se a vossos olhares, prometeu-vos: ‘Eis que estou convosco até a consumação dos séculos’ (Mt 28,20). Foi com razão que o Apóstolo nos dizia: ‘O Senhor está próximo! Não vos inquieteis’ (Fl 4,5.6). Cristo está sentado acima dos céus e estes estão longe: contudo aquele que está sentado lá, está próximo de nós.” (Santo Agostinho. Comentário aos Salmos. Salmo 46,7. Paulus, p. 799)
A quarta lição, enfim, que podemos tirar da Ascensão do Senhor é que devemos suplicar sempre a vinda do Espírito Santo. É o Espírito Santo que torna o Cristo sempre presente na sua Igreja; é o Espírito que alimenta a nossa esperança na sua vinda gloriosa; é o Espírito Santo que faz de nós testemunhas da sua Ressurreição e Ascensão e que nos faz proclamar aos quatro cantos da terra a sua vinda gloriosa. Por isso, ao celebrarmos a Ascensão do Senhor e ao nos prepararmos para o Santo Pentecostes que coroa todo o Tempo Pascal, peçamos que o Senhor renova em graça do seu Espírito Santo. Que este mesmo Espírito que nos foi dado no dia do nosso Batismo, que nos marcou no dia do nosso Crisma com seus sete dons, venha sobre nós de maneira especial nestes dias, nesta semana em que nos preparamos para celebrar o Santo Pentecostes, a fim de que se renove a nossa fé e a nossa esperança, e a fim de que a caridade de Cristo, crescendo em nossos corações, nos torne verdadeiras testemunhas do Ressuscitado “até os confins da terra”.
[1] São Leão Magno, Sermão I, Sobre a Ascensão.
[2] São Leão Magno, Sermão I, Sobre a Ascensão.
[3] Santo Agostinho. Sermão Sobre a Ascensão. LH Vol. II, p. 828