Estamos entrando em novo ano… Isto nos recorda uma imagem habitual entre os antigos pensadores gregos pré-cristãos, a saber: a roda da vida (ho tróchos tes genéseos). Tal imagem foi reassumida por São Tiago na sua epístola: “A língua põe em chamas o ciclo da existência ou a roda da vida” (3,6).
Por que comparavam os antigos a nossa vida com uma roda?
Três são as explicações possíveis:
- Na roda que se move, o que está na parte superior vai para baixo, e vice-versa. Assim a roda seria o símbolo da sorte, que exalta e rebaixa sucessivamente os homens.
- A roda é a imagem da sucessão e da mudança. Simboliza, pois, a sucessão das gerações que perfazem a trama da história.
- A roda é um círculo… Os antigos usavam tal imagem para designar a história e tudo o que ela contém.
Compreende-se que, a tantos títulos, a roda se tenha tornado a figura da existência humana.
Observamos, porém, que tal imagem traduz certo pessimismo. Com efeito, a roda significa um rolar monótono, insípido, algo de fechado em si, sem saída; lembra também o “eterno retorno” ou o pretenso ciclo das reencarnações, que sufoca e agrilhoa o homem e do qual os antigos tanto queriam libertar-se! — Por isto o Cristianismo prefere, para designar a vida, uma outra imagem: a do cone. Este é uma figura que se vai abrindo e dilatando cada vez mais, como se estivesse para abarcar o Infinito. Exprime assim muito adequadamente a dinâmica da vida cristã, que é uma semente de eternidade (a graça santificante é o gérmen da glória), a qual se vai desabrochando sucessivamente até chegar ao encontro face-a-face com a Beleza Infinita de Deus.
Senhor, no novo ano que agora iniciamos, possamos reconhecer todos os dias o teu santo desígnio e a tua reconfortadora presença! Peregrino com os peregrinos, és também a Grande Mercê dos que terminam a caminhada!
Pe. Estêvão Bettencourt, OSB
Texto publicado na Revista Pergunte e Responderemos nº 278, Jan/1985.