Uma das mais belas orações contidas no Antigo Testamento é a que se encontra em Sb 9,1-6.9-11. “Deus de nossos pais,… dai-me a sabedoria que está junto a Vós no vosso trono”.
Que é essa sabedoria? É o atributo de Deus que deu existência harmoniosa e proporcionada a todas as coisas. Para reconhecê-la, basta olhar para a grandeza do universo e o equilíbrio dos astros; basta olhar também para o microcosmos.
O autor sagrado, tido como Salomão, pede-a para si a fim de que possa desempenhar dignamente as funções que o Senhor lhe conferiu; “ainda o mais perfeito entre os filhos dos homens nada será sem a vossa sabedoria”.
Também nós, conscientes de nossa incapacidade, pedimos a sabedoria do Pai do céu para poder traçar uma escala de valores correta e proceder de acordo com os bens visíveis que atraem o ser humano a ponto de, muitas vezes, o sufocar, impedindo-o de ver exatamente o valor de cada uma dessas criaturas. Obcecam o olhar e causam graves crises ao cristão. É a sabedoria que mostra o sentido da vida, que é simplesmente a passagem do finito e transitório para o Infinito e o Definitivo. Diz São Paulo: “Não olhamos para as coisas que se vêem, mas para o que não se vê, pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê, é eterno” (2Cor 4,18).
Exemplo típico de não sabedoria ou insensatez está na parábola de Lc 12,16-21: Um homem teve uma colheita tão farta que julgou poder ficar tranqüilo para o resto da vida, comendo, bebendo, repousando e regalando-se. Mas Deus lhe disse: “nessa mesma noite ser-te-á reclamada a tua alma, e os bens que acumulaste, de quem serão?”.
É preciso, pois, que o cristão, mesmo vivendo no aquém, obrigado a dar contas de suas tarefas profissionais, saiba contemplar tudo a partir da eternidade, pois sabedoria é saber ver o presente em função do futuro que não passa. Em conseqüência, toda a vida do discípulo de Cristo será um encaminhamento para o Definitivo e a morte será diretamente a porta de entrada no feliz Além. Na verdade, sabedoria é contemplar o aquém com os olhos do além.
“Enviai-a dos santos céus. Enviai-a do trono da vossa glória. Esteja comigo e tome parte nos meus trabalhos, para que eu saiba o que Vos é agradável”.
Pe. Estêvão Bettencourt, OSB
Texto publicado na Revista Pergunte e Responderemos nº 545, Novembro/2007