Na literatura cristã de começo do século III encontra-se uma carta, de autor desconhecido, destinada a certo Diogneto, na qual o escritor apresenta o que é o “ser cristão”. É peça notável, cujo teor merece ser recordado em nossos dias, pois conserva pleno significado.
O autor refere que os cristãos em nada diferem dos demais homens no plano biológico, social, econômico… Todavia em seu íntimo trazem uma vitalidade que transcende as leis da matéria: “Quando entregues à morte, são vivificados. Na pobreza enriquecem a muitos… São desprezados, mas, no meio de desonras, sentem-se glorificados”. E finalmente: “Para resumir numa palavra: o que é a alma no corpo, são os cristãos no mundo”.
Estas palavras não são totalmente novas na literatura cristã, pois já o Apóstolo afirmava: Vivemos “como punidos e, não obstante, livres da morte; …como indigentes, e, não obstante, enriquecendo a muitos; como nada tendo, embora tudo possuamos” (2Cor 6,10).
Essa vitalidade rica do cristão não resulta de conquistas humanas, mas é dom de Deus. É a participação na Páscoa de Cristo, que transfigurou a dor e a morte, colocando na própria ignomínia uma semente de glória.
A consciência deste tesouro há de ser constantemente reavivada no cristão, pois ele está sujeito às vicissitudes que afetam todos os homens click here for info. Nas horas de tribulação e angústia, saiba assumir a atitude de quem vê o sentido transcendental das borrascas presentes. Procure ser fermento na massa, sal da terra, luz do mundo. O Concílio do Vaticano II, referindo-se aos fiéis em geral exorta:
“Cada leigo individualmente deve ser perante o mundo uma testemunha da ressurreição e vida do Senhor Jesus e sinal do Deus vivo. Todos juntos, e cada um na medida das suas possibilidades, devem alimentar o mundo com frutos espirituais… Numa palavra: o que a alma é no corpo, isto sejam no mundo os cristãos” (Lumen Gentium nº 38).
É oportuno lembrar isto num momento importante como o que o Brasil está vivendo: critérios meramente naturais ou humanos, atitudes utilitárias pouco consentâneas com a escala de valores do Evangelho podem seduzir o cristão. Este há de procurar não trair sua missão de portador de novas perspectivas para os seus semelhantes; ele tem para com estes um débito de que o Senhor Deus lhe pedirá contas um dia: “O que a alma é no corpo, sejam os cristãos no mundo“. Desta santa ufania o cristão não pode abrir mão; antes, traduza-a em atos e vida!
Pe. Estêvão Bettencourt, OSB
Texto publicado na Revista Pergunte e Responderemos nº 326, Julho/1989.