1ª Leitura: Am 7,12-15
Sl 84
2ª Leitura: Ef 1,3-14
Evangelho: Mc 6,7-13
Deus nos mostra “a luz da verdade”
A primeira leitura que ouvimos neste domingo é um trecho do livro do profeta Amós, que atuou em Israel no séc. VIII a.C. Ele vive num tempo em que o povo de Deus está dividido em dois reinos: o do Norte (Israel) e o do Sul (Judá). Amós é enviado ao Reino do Norte, no tempo do rei Jeroboão II, com a missão de anunciar uma mensagem que desagrada ao Rei: a nação será exilada, em virtude do seu pecado.
O fruto do endurecimento do coração é o exílio, uma espécie de volta ao Egito. É o drama do pecado. Deus, em seu infinito amor, nos oferece a liberdade. Nós optamos pelo pecado e pela escravidão. É assim desde Adão. Mas Deus, na sua infinita misericórdia, também desde Adão, revela a “luz da verdade” aos que erram e escolhe aqueles que devem ser portadores desta “luz da verdade” (cf. Oração Coleta da Missa). O profeta é alguém que tem um carisma específico: ser a boca de Deus, para anunciar não uma palavra sua, mas a Palavra de um Outro, pois n’Ele – em Deus – está a fonte da vida; só n’Ele, na sua luz, encontramos a luz.
Amós é uma figura emblemática. Na sua época haviam os chamados “profetas de corte” que profetizavam por profissão. Na maioria das vezes, estes profetas estavam preocupados em se manter em sua função. Por isso, profetizavam o que o rei queria ouvir. Amós é um profeta no sentido próprio do termo. Diríamos que ele é um “profeta por vocação”. Ele não exerce a profecia como profissão, mas foi chamado pelo Senhor para ir ao Reino do Norte mostrar ao rei a luz da verdade, porque este está no erro. Amasias, sacerdote de Betel, faz uma proposta a Amós: Vidente, profetiza na tua terra, lá você poderá dizer o que quiser contra o reino do norte, porque eles não gostam mesmo de nós, mas aqui você será morto, porque este é o santuário do rei e aqui só se deve profetizar a favor do rei.
O sacerdote lhe propõe falsear a verdade para agradar aos homens. É a proposta que também chega aos nossos ouvidos hoje. A sedução de Amasias está também no meio de nós. Somos chamados a anunciar a “luz da verdade” aos que erram e a também recebermos a “luz da verdade” quando estivermos no erro. Todavia, nos fechamos à luz e, quando somos nós os portadores dessa luz, a transformamos em trevas para poder agradar aos homens. Amós, todavia, não se rende diante da tentação de Amasias. Ao contrário, Amós afirma com veemência: não sou profeta, nem filho de profeta. Amós é ou não profeta? Claro que é, mas não no sentido como Amasias entende o profetismo, por isso a afirmação: não sou profeta, nem filho de profeta (o que aqui quer dizer membro de uma corporação profética). Amós não é profeta por profissão, mas o Senhor “o chamou” e “disse”: “Vai profetizar para Israel, meu povo.” O profeta não vai anunciar uma palavra sua, mas Ele recebe uma Palavra de um outro e, por isso, precisa anunciá-la. Amós vai dizer em 3,8: “O Senhor Adonai falou: quem não profetizará?”
No Evangelho, em Mc 6,6b, o evangelista apresenta o Cristo que, depois de se deparar com a incredulidade dos seus parentes, sai pelos povoados ensinando. No versículo seguinte Ele envia os seus discípulos para que continuem a sua missão: “Começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros” (Mc 6,7). Jesus comunica a sua autoridade aos seus apóstolos. Os apóstolos não vão em seu próprio nome, nem com a sua própria autoridade, mas eles são portadores da autoridade do próprio Cristo. Eles devem estar despojados de tudo, não somente dos apetrechos físicos, mas também da esperança de sucesso, para que possam ser assim anunciadores do próprio Cristo. O possível fracasso, ainda que aparente, é uma forma de se unirem ao destino do próprio mestre que os enviou. Assim como Jesus inicia a sua missão anunciando a conversão e expulsando os demônios e curando as enfermidades como um sinal da presença do Reino, assim também os apóstolos são pregadores da conversão, da mudança de mentalidade, de pensamento, e portadores do poder de curar e expulsar demônios, poder que não é deles, mas que eles exercem em nome de Cristo.
De fato, a Palavra do Senhor nos mostra hoje que o Senhor envia a “luz da verdade” aos que erram para retornarem ao bom caminho. No AT enviou Amós, profeta por vocação, não porque quisesse apenas acusar o povo, mas por amor, a fim de que o seu povo se convertesse. A ternura do Senhor pelo povo é expressa pelas últimas palavras da profecia, onde o próprio Amós testemunha: “Ele me disse: profetiza a Israel ‘meu povo’”. No Evangelho, Ele envia seu próprio Filho e, como continuadores de sua obra salvífica, os apóstolos, para nos mostrarem a luz da verdade, a nós que caminhávamos nas trevas do pecado e da ignorância. Estejamos atentos ao modo como recebemos essa luz da verdade que o Senhor nos envia. Será que estamos atentos ao que os nossos legítimos pastores nos indicam ou vamos atrás de qualquer vento de doutrina? Os que são encarregados de portar e transmitir a luz da verdade, devem estar atentos a si mesmos e ao modo como ensinam. Não se deve sucumbir à tentação de Amasias, falseando a verdade em nome de um sucesso passageiro.
Tenhamos no coração a gratidão ao Senhor, que nos envia sempre por diversos meios a luz da Verdade, a fim de que caminhemos na Verdade. Ao mesmo tempo, peçamos que o Espírito do Senhor venha em socorro da nossa fraqueza, a fim de não sucumbirmos jamais à tentação de falsear a verdade em nome da fama ou do aplauso. Que sendo fiéis até o fim, recebamos do Pai a recompensa por termo feito da nossa vida um verdadeiro “louvor da glória do Pai” (segunda leitura).