1ª Leitura: Is 5,1-7
Sl 79
2ª Leitura: Fl 4,6-9
Evangelho: Mt 21,33-43
No evangelho deste Domingo, Jesus apresenta de modo sintético a história da salvação por meio da parábola da vinha e dos vinhateiros. A imagem da vinha para representar o povo de Israel é muito cara ao AT e aparece nos profetas (cf. Jr 2,21; Ez 15,1-8; Is 5,1-7). De modo particular, poderíamos destacar a imagem que hoje nos é apresentada pela primeira leitura deste domingo. O profeta canta para o “seu amado” o cântico da vinha de um amigo dele. Neste cântico, o amigo do profeta é o próprio Deus e a vinha o povo de Israel.
O profeta descreve todos os cuidados que Deus teve para com o povo escolhido: “Cercou-a, limpou-a de pedras, plantou videiras escolhidas, edificou uma torre no meio e construiu um lagar.” Todavia, a videira produziu uvas selvagens. O povo de Israel depois de ter sido tirado por Deus do Egito, da terra da escravidão, e ter sido plantado na Terra Prometida, terra onde corre leite e mel[1], deveria produzir bons frutos, mas produziu frutos ruins: a idolatria, a prostituição com os falsos deuses, a confiança maior no poder estrangeiro do que no Deus que os havia tirado com mão forte da casa da escravidão. Sendo assim, diz o próprio Deus no final da parábola, a vinha será abandonada à sua própria sorte, será pisoteada, porque Deus vai remover a sua cerca, e secará, porque Deus não lhe mandará mais as chuvas benfazejas. O Salmo responsorial, por sua vez, é uma súplica, para que Deus visite seu povo, sua vinha: Voltai-vos para nós, Deus do universo! Olhai dos altos céus e observai. Visitai a vossa vinha e protegei-a! (Sl 79,15)
Tendo por base este trecho do profeta Isaías, Jesus conta, então, a parábola dos vinhateiros homicidas. Jesus demonstra nessa parábola que, essa fúria de Deus pintada pelo profeta Isaías no cântico da vinha, na verdade foi permeada por muita misericórdia, porque Deus, ao longo da história da salvação, embora tenha permitido que o seu povo escolhido sofresse as consequências do pecado, indo e vindo dos dois exílios, nunca os abandonou à própria sorte e sempre esperou pacientemente pelos seus frutos, enviando seus servos, os profetas, que tinham como missão recolher algum fruto da videira do Senhor.
Por fim, o Pai, numa explosão de misericórdia, enviou o seu próprio Filho, pensando: “Ao meu Filho eles vão respeitar”. Os vinhateiros não somente não deram ouvidos ao Filho, mas confabularam entre si e resolveram matar o Filho fora da vinha a fim de ficarem eles mesmos com a vinha que era de seu patrão. Jesus pergunta, então, aos chefes dos sacerdotes e aos anciãos do povo o que o patrão, o que esse pai deveria fazer com os vinhateiros. Os interlocutores de Jesus o respondem, dando contra si próprios a sentença de condenação: “Com certeza mandará matar de modo violento esses perversos e arrendará a vinha a outros vinhateiros, que lhe entregarão os frutos no tempo certo.” (cf. Mt 21,41). Jesus não afirma que Deus fará conforme o que os anciãos do povo e os sacerdotes dizem, mas lhes diz com clareza que “o Reino de Deus” lhes será tirado e será entregue a um povo que produza frutos.
Jesus se coloca no centro dessa parábola. Ele é o Filho enviado pelo Pai, a fim de que o povo escolhido produza algum fruto. Mas, Jesus vai ser morto fora de Jerusalém, fora da vinha. Sua morte, longe de ser o fim, é na verdade, o grande começo, é o centro de tudo, porque pela sua morte nos veio a salvação. “A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto vem do Senhor, e é maravilha aos nossos olhos.”[2] Com estes versículos do Salmo 118 (117) Jesus explica o mistério da sua morte: rejeitado pelos construtores e lançado fora, Ele se torna a pedra principal, ou seja, aquela que dá sustentação a todo o edifício.
Morrendo fora de Jerusalém Jesus põe termo aos sacrifícios antigos, porque Ele se fez o nosso sacrifício de expiação, único e definitivo. Morrendo para nos salvar, Jesus nos manifesta o amor infinito do Pai por nós como nos diz São João: “Pois Deus não enviou o seu Filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele.”[3]
Jesus conclui a parábola dizendo que, já que os vinhateiros, ou seja, o povo de Israel e seus guias e mestres, não acolheram o Filho, o Messias enviado pelo Pai, a vinha, ou seja, o Reino de Deus, lhes será tirado e será entregue a um povo que produza frutos: aos pagãos e a todos aqueles que aderirem ao Senhor pela fé, porque como nos diz São Paulo: “De sorte que não há distinção entre judeu e grego, pois ele é Senhor de todos, rico para todos os que o invocam.”[4]
Os sumos sacerdotes, os fariseus e os mestres da Lei procuram, a partir de então, matar Jesus, porque eles entenderam que era deles que Jesus estava falando: “Ouvindo estas palavras, os altos funcionários do templo e os fariseus entenderam que ele se referia a eles e procuravam capturá-lo, mas tinham medo da multidão que o considerava um profeta.”[5]
Jesus anuncia aqui o mistério da Igreja, novo povo de Deus, constituído a partir do mistério da sua Páscoa, que recebe a missão de produzir frutos, de ser guardiã dos mistérios do Reino. A este povo qualquer um pode pertencer, desde que preste sua adesão a Cristo por meio da fé, e uma fé que não seja estéril, mas que produza frutos de justiça.
Agradeçamos ao Senhor por fazermos parte deste novo povo, desta nova vinha escolhida, plantada e cuidada pelo nosso Deus de amor. E peçamos a graça de sermos uma vinha que produza frutos para Deus, apesar de nossas fraquezas e limites.
[1] cf. Dt 31,20
[2] Sl 118 (117), 22-23
[3] cf. Jo 3,16-17
[4] cf. Rm 10,12
[5] cf. Mt 21,45-46