1ª Leitura: Ez 37,12-14
Sl 129 (130)
2ª Leitura: Rm 8,8-11
Evangelho: Jo 11,1-45
Nesse quinto domingo da quaresma do Ano A, um ciclo de leituras marcadamente batismal, contemplamos esta belíssima cena do evangelho de São João: a ressurreição de Lázaro. Jesus recebe um aviso: “Senhor, aquele que amas está doente” (Jo 11,3). O amigo de Cristo está doente. Sim, os amigos de Cristo também adoecem. Aqueles a quem Jesus ama também adoecem e, até mesmo, morrem. Jesus afirma que a doença de Lázaro não é mortal, mas que ela tem uma finalidade: que “seja glorificado o Filho de Deus”. Aqui encontramos uma estreita semelhança com o evangelho do cego de nascença que ouvimos no domingo passado. Os apóstolos queriam saber quem havia pecado para que aquele homem nascesse cego. Jesus afirma que nem o homem nem seus pais haviam pecado, mas que ele havia nascido cego “para que nele” fossem “manifestadas as obras de Deus”. As obras de Deus se manifestam quando Jesus cura o cego de nascença. A glória de Deus se manifesta diante da doença e da morte de Lázaro.
Jesus ainda permanece dois dias no local onde está antes de se dirigir à casa de Lázaro. Só depois resolve voltar à Judeia para despertar Lázaro do “seu sono”. Os apóstolos ainda não entendem a forma de falar de Cristo e afirmam: “Senhor, se ele está dormindo, vai se salvar!” Cristo faz questão de mostrar que Lázaro está, de fato, morto. Ele “se alegra” pelo fato de não ter podido evitar a morte de Lázaro. Cristo não se alegra com a morte de Lázaro em si, mas com o fato de que a ressurreição de Lázaro será um sinal para que os discípulos e muitos outros possam “crer”.
É a última ida de Cristo à região da Judeia. Cristo vai até lá ressuscitar aquele que Ele ama. Seu primeiro encontro é com Marta. Ela acredita firmemente que se Cristo estivesse lá Lázaro não teria morrido. De alguma forma, essa mulher intui que Cristo possui a capacidade de dar a vida. Todavia, no encontro com Cristo Marta dará um passo definitivo na sua fé, uma espécie de ressurreição: “Disse ela: ‘Sim Senhor, eu creio que tu és o Cristo, o Filho de Deus que vem ao mundo”’. Depois de professar a sua fé ela vai chamar Maria. Esta, sabendo que o Senhor estava presente “ergueu-se logo” e “foi ao seu encontro”. É interessante notar que aqui João utiliza um verbo que também aparece para indicar a ressurreição, o verbo grego “egheiro”. Maria, à semelhança de Marta, experimenta também uma espécie de ressurreição. Quando chamada pelo Senhor, ela como que ressuscita e vai ao encontro d’Aquele que é a fonte da vida.
A reação de Jesus diante das lágrimas de Maria e dos demais judeus nos revela a sua humanidade. De fato, como nos afirma o prefácio da missa de hoje: “Verdadeiro homem, Jesus chorou o amigo Lázaro. Deus vivo e eterno, ele o ressuscitou, tirando-o do túmulo.” O versículo 35 deste evangelho nos diz que “Jesus chorou”. As lágrimas de Cristo foram reveladoras. Diante delas, os outros que estavam presentes puderam expressar: “Vede como ele o amava!” É o amor que move o coração de Cristo a mandar que se retire a pedra. Cristo não pode permitir que a morte prenda seus amados. Ele é a vida dos mortos!
Mesmo diante da resistência dos presentes, Cristo ordena que a pedra seja removida e, olhando para o alto, pronuncia uma berakah, uma oração tipicamente judaica, uma oração de ação de graças. Jesus expressa aqui toda a sua confiança de Filho ao dizer: “Pai, dou-te graças porque me ouviste. Eu sabia que sempre me ouves; mas digo isso por causa da multidão que me rodeia, para que creiam que me enviaste.” Cristo dá graças ao Pai, faz a sua eucaristia, a sua ação de graças, e grita em alta voz: “Lázaro, vem para fora!” É uma ordem de Cristo àquele que jazia na região dos mortos: “Lázaro, vem para fora!” É um chamado de amor para aquele que se achava deitado e sem vida: “Lázaro, vem para fora!” Cristo manda que as mãos e os pés de Lázaro, agora ressuscitado, sejam desatados, para que ele possa ir livremente onde quiser. Diante desse gesto, muitos creram em Jesus (Jo 11,45).
O que aconteceu com Lázaro, acontece conosco. Nós também somos os “amados de Cristo”. Foi o seu amor por nós que o moveu a assumir a nossa humanidade. Cristo é a expressão máxima do amor do Pai por nós. Por amor ele assumiu a nossa vida e a nossa morte. Assumiu a nossa vida, para nos fazer participar da sua vida. Assumiu a nossa morte, para destruí-la e nos dar a vida verdadeira e eterna que está escondida com Ele nos céus.
Cristo também chora a morte do homem caído no pecado. Sair dos nossos pecados é fazer uma experiência de ressurreição; é como sair do nosso “túmulo”. O prefácio da missa de hoje nos diz: “Compadecendo-se da humanidade, que jaz na morte do pecado, por seus sagrados mistérios ele nos eleva ao Reino da vida nova”. O Batismo é esse sair do túmulo. Nós, já batizados, cada vez que nos reconciliamos com o Senhor e participamos do seu banquete, somos também espiritualmente ressuscitados. Ao nos levantarmos dos nossos bancos para ouvir o Evangelho é como se estivéssemos, de dentro dos nossos túmulos, ouvindo a voz de Cristo que docemente nos convida à vida. Ao sairmos de nossos lugares para tomarmos o Sagrado Alimento é a vida de Cristo que nos refaz.
Todavia, Cristo nos ressuscitará definitivamente para uma vida melhor. Nós tememos a morte. O nosso temor da morte consiste no fato de que nós não fomos feitos para a morte e, sim, para a vida. Temos medo de permanecer na morte. Às vezes, quando perdemos alguém, dizemos como Marta: “Senhor, se tivésseis estado aqui, meu irmão não teria morrido”. Gostaríamos de ter uma ressurreição como a de Lázaro. Cristo, todavia, prepara para nós uma ressurreição melhor. Lázaro ressuscitou para esta vida. Cristo nos ressuscitará para a vida eterna. Nós não teremos uma ressurreição como a de Lázaro, mas teremos uma ressurreição como a de Cristo. Nós entraremos no sono da morte, como Cristo e como Lázaro. Mas, de dentro dos nossos túmulos, quando na solidão a vida tiver saído de nossos corpos, Cristo, Aquele que é a vida, nos enviará um chamado, uma Palavra de vida que nos fará levantar do sono da morte. Ele dirá uma vez por todas, com voz forte: “Vem para fora!” E nós sairemos, e caminharemos em direção Àquele que nos ama, ao nosso amigo, aquele que chorou por nós e que não suportou nos ver no sono da morte; aquele que, para nos tirar do túmulo e da morte, entrou Ele mesmo na solidão do túmulo e na escuridão da morte.
O Pai, que ressuscitou Jesus dentre os mortos, dará vida a nossos corpos mortais por meio do seu Espírito que habita em nós (segunda leitura). O Espírito de Cristo mora em nós, por isso cremos que não permaneceremos no sono da morte, mas seremos ressuscitados, chamados pela voz amorosa de Cristo. O Pai, no Espírito, por meio da voz amorosa de seu Filho, nos ressuscitará e estaremos unidos a Ele para sempre. Com o coração jubiloso por esta doce esperança, vivamos já hoje segundo o Espírito. Abramos o nosso coração neste tempo favorável que é a Quaresma para que a força do Senhor nos preencha a fim de que nós, templos vivos do Espírito, possamos viver segundo o Espírito, por meio do qual seremos vivificados em nossos corpos mortais quando chegar o definitivo Dia de Cristo.