1ª Leitura: Ex 17,3-7
Sl 94
2ª Leitura: Rm 5,1-2.5-8
Evangelho: Jo 4,5-42
O salmo responsorial deste domingo nos convida a abrirmos bem os nossos ouvidos, a fim de estarmos atentos à Palavra: “Hoje, se ouvirdes a voz de Deus, não endureçais o vosso coração!” O nosso coração tem sede de Deus e da sua Palavra: ela é a “água viva” (cf. Jo 4,10) capaz de saciar plenamente.
A primeira leitura fala-nos de uma sede. Moisés conduz o povo até Rafidim, onde não havia água para se beber. O povo, continua a leitura, “sedento de água”, “murmurava contra Moisés”. Ao experimentar a sede do deserto o povo quer voltar às fontes antigas, ao Egito, incapaz de saciar a sua sede. Deus, todavia, lhes revela uma fonte nova, um rochedo ferido pelo cajado de Moisés de onde brota uma água capaz de saciá-los. Paulo nos fala na carta aos Coríntios que este rochedo, do qual o povo bebeu, era símbolo de Cristo: …bebiam de uma rocha espiritual que os acompanhava, e essa rocha era Cristo (cf. 1Cor 10,4).
Que Cristo é a fonte de água viva, nos testemunha também o evangelho que hoje a liturgia nos propõe, o qual nos relata o encontro de Jesus com a Samaritana. É o tema batismal da água viva. Testemunhamos neste evangelho o encontro de duas sedes: a sede de Jesus, que pede à samaritana “dá-me de beber” e a sede da samaritana, que vem ao poço cotidianamente tirar água. Jesus, de fato, tinha “sede da fé daquela mulher”, como nos diz Santo Agostinho no seu Tratado sobre o Evangelho de São João. A mulher, por sua vez, tinha uma sede que não podia ser definitivamente saciada pela água do poço de Jacó. Finalmente ela está diante de alguém que pode saciar a sua sede.
O que acontecia no Êxodo em figuras, agora se realiza, no Evangelho, de forma definitiva. A samaritana, que tantas vezes buscou uma água que não a saciava, agora se encontra diante do doador da água viva. Tantas vezes também nós, como a samaritana, buscamos uma água que não nos sacia. Cristo, todavia, nos dá uma água que, quem dela beber “nunca mais terá sede”. Esta água viva prometida por Jesus é o “Espírito que deviam receber aqueles que tinham crido nele” (cf. Jo 7,39), conforme nos explica mais adiante João.
João afirma, no seu relato da paixão, que um soldado rasgou o lado de Jesus com a lança e que de seu lado aberto brotou “sangue e água” (cf. Jo 19,34). É a água viva do Espírito que brota do lado aberto de Jesus na cruz. Esse é o Espírito que recebemos ao mergulharmos nas águas do Batismo, o qual está, agora, dentro de nós, como uma fonte que jorra para a vida eterna. Santo Inácio de Antioquia entendeu bem isso e disse numa de suas cartas que percebia dentro de si “uma água viva e murmurante que lhe dizia: Vem para o Pai!” Essa é a voz do Espírito que Jesus nos deu e que mora em nós como num Templo.
Jesus continua o seu diálogo com a samaritana e esta fica surpresa quando ele lhe revela sua vida íntima: ela havia tido cinco maridos e o que agora tinha não era dela. Essa mulher é símbolo dos samaritanos que, segundo 2Rs 17,24-41, haviam se formado na época do exílio da Assíria pela junção de cinco povos pagãos que passaram a cultuar também os seus deuses, além do Deus único e Verdadeiro. Ela se vê surpreendida pela vidência desse “profeta” e lhe propõe uma questão: onde se deve adorar? Os judeus haviam dito que era em Jerusalém; os samaritanos, por sua vez, insistiam que também se podia adorar no Garizim. Jesus lhe afirma que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em Espírito e em verdade. O culto verdadeiro que o Pai procura não está mais confinado a um lugar específico. Em todo lugar lhe pode ser prestado um culto autêntico, graças ao Espírito que foi derramado sobre os crentes.
Enquanto a samaritana sai para dar seu testemunho aos seus conterrâneos, Jesus se volta para os discípulos que querem que Ele coma. Jesus, que antes havia manifestado sua sede, agora fala de sua fome, que tem sentido espiritual: fome de fazer a vontade do Pai. Devemos também nós pedir ao Espírito que faça arder em nós uma sede e uma fome espirituais. A nossa sede deve ser sede da água viva que Jesus abundantemente deseja nos dar. A nossa fome, por sua vez, deve ser semelhante à de Jesus. Nosso “alimento” deve ser “fazer a vontade” daquele que nos enviou Jesus. Devemos amar a vontade do Pai até as suas últimas consequências, como Jesus amou.
Embora Jesus diga à samaritana que “a salvação vem dos judeus” ela agora está aberta a todos. Os samaritanos são os primeiros frutos colhidos (cf. Jo 4,35). Eles dão a Jesus a resposta da fé: “Nós próprios o ouvimos, e sabemos que esse é verdadeiramente o salvador do mundo” (cf. Jo 4,42). O testemunho da mulher, que fez uma experiência com Cristo, arrasta os seus conterrâneos que fazem, eles mesmos, uma experiência pessoal com Cristo e prestam-lhe agora a obediência da fé.
A mulher revela diante de Jesus a sua esperança numa intervenção divina que he trará resposta às suas indagações mais profundas: “Sei que vem um Messias. Quando ele vier, nos anunciará tudo” (cf. Jo 4,25). Jesus responde à mulher: “Sou eu, que falo contigo”. Jesus é a resposta que aquela mulher procurava; a água viva, da qual ela tinha sede. Ele é o Salvador esperado pelo homem ferido, a cura que o homem doente pelo pecado aguarda ansiosamente.
O evangelho termina com o reconhecimento por parte dos samaritanos de que Jesus é o Salvador do mundo: “Nós próprios o ouvimos, e sabemos que esse é verdadeiramente o salvador do mundo”. Jesus é o Salvador do mundo, aquele que nos anuncia tudo: a salvação que esperávamos e necessitávamos. Ele é para nós a esperança da glória, da qual Paulo nos fala na segunda leitura. A vida do nosso Salvador é para nós a Palavra mais eloquente. Assim como Cristo morreu e ressuscitou, nós também ressuscitaremos. A vida de Jesus e, sobretudo, a sua Páscoa é a resposta, a única resposta, a melhor resposta, a resposta verdadeira para as nossas indagações. Peçamos ao doador da água viva que nessa liturgia abra sobre nós a sua fonte divina. Deixemo-nos banhar nas águas vivas do Espírito para que os nossos olhos se abram para ver a glória do Senhor e a nossa inteligência também se abra para compreender os seus mistérios.