1ª Leitura: Is 40,1-5.9-11
Sl 84
2ª Leitura: 2Pd 3,8-14
Evangelho: Mc 1,1-8
Neste segundo domingo do Advento, a primeira leitura, o início do chamado “Dêutero-Isaías”,[1] proclama o fim da desolação do povo de Israel e anuncia o iminente fim do exílio e o consequente retorno para a terra prometida. Estes capítulos do livro do profeta Isaías são geralmente datados como tendo sido compostos no fim do exílio. Deus ordena ao profeta que envie ao povo uma palavra de “consolação”: sua falta foi expiada e sua servidão terminou. É anunciada a vinda do Senhor, como um pastor que há de apascentar seu povo e, por isso, sua estrada deve ser aplainada; no deserto um caminho deve ser preparado, para que o Senhor, por Ele, traga de novo os exilados a fim de que estes se rejubilem em Sião.
A ação libertadora de Deus é experimentada como sinal da sua presença e da sua força. Se o exílio foi a experiência do juízo de Deus, o retorno do exílio é a experiência do amor misericordioso d’Aquele que jamais abandona seu povo à própria sorte. Contudo, a palavra do Senhor anunciada pela boca do profeta Isaías tinha um alcance ainda maior. Marcos cita Is 40,3 juntamente com Ml 3,1 no início do seu evangelho, o qual é proclamado na liturgia de hoje. Juntando Is 40,3 com Ml 3,1, o último dos profetas, Marcos demonstra que, em Cristo, tudo o que fora anunciado e predito começava a se realizar. João Batista é o mensageiro predito por Malaquias e ele tem por missão “preparar o caminho do Senhor e endireitar as suas veredas”, que outra coisa não são senão o coração dos homens necessitados de conversão, a fim de que o Senhor, que está vindo, possa ser acolhido nesses mesmos corações.
João Batista é uma personagem que une o Antigo ao Novo Testamento. Ele é o último dos profetas, mas já vê aquele a quem Ele anuncia, o que o torna o “maior entre os nascidos de mulher” (Mt 11,11; Lc 7,28). Diante do seu testemunho de homem penitente e da sua pregação, muitos vão ao seu encontro. O núcleo da pregação de João nada tem de mero moralismo, mas é anúncio da vinda de um outro: “Depois de mim virá alguém mais forte do que eu”! O que virá depois de João, o Cristo, é aquele pelo qual os últimos tempos começam a se realizar, pois do Cristo João afirma que ele batizará com o Espírito Santo. No Antigo Testamento, os últimos tempos são marcados pela presença do Divino Espírito, que haverá de ser derramado sobre todos os homens (cf. Jl 3,1). João anuncia que, em Cristo, essa expectativa se realizará, pois n’Ele encontram-se cumpridas as promessas que Deus havia feito às gerações passadas.
O salmo responsorial é, também, a seu modo, uma proclamação da vinda do Cristo. Profeticamente, o salmista anuncia que “a verdade e o amor se encontrarão, a justiça e a paz se abraçarão; da terra brotará a fidelidade e a justiça olhará dos altos céus”. Verdade, amor, justiça e paz são conceitos muito significativos no contexto do Antigo Testamento. O salmista, a certa altura, afirma: “A verdade brotará da terra, e a justiça, dos céus, olhará” (cf. Sl 85[84],12. A verdade, o Cristo, brotou da terra… Adão, no início, foi feito do pó da terra (Gn 2,7), mas Deus soprou nele seu hálito de vida, tornando-o um ser vivente. E foi de uma filha de Adão – daquele que outrora era apenas pó, mas que fora vivificado pelo Santo Espírito – a mais bela de todas, a escolhida desde os séculos, a Virgem Maria, que nasceu para nós Aquele que é a própria Verdade. Foi assim que ele se apresentou a nós: “Eu sou o caminho, a Verdade e a vida” (Jo 14,6). Cristo, a Verdade, brotou da terra, isto é do seio virginal da Filha de Sião. Nele, todas as promessas do Pai se realizaram e nós somos, então, bem-aventurados, porque vimos e ouvimos o que tantos que vieram antes de nós quiseram ver e ouvir (Lc 10,23-24). “Justiça” é um outro nome que podemos dar a Cristo, pois Ele nos tornou justos pelo seu sacrifício redentor. Dos céus, dos altos céus, Ele nos olhou e, compadecido de nós, de lá desceu, como orvalho das alturas, para nos redimir e introduzir no Reino de seu Pai.
O advento, nas suas primeiras semanas, nos coloca diante de uma sadia tensão: nos preparamos para celebrar o mistério da primeira vinda do Senhor, recordando-nos que Ele virá uma segunda vez no fim dos tempos. Isso nos é recordado pelas eucologias e, também, nesse segundo domingo, pela leitura da segunda carta de São Pedro. Em 2Pd 3,4 é colocada a questão acerca da Parusia, da segunda vinda do Senhor. A aparente demora significa que sua promessa, afinal, terá falhado? O autor da carta responde com uma citação do Salmo 90(89),4: “Pois mil anos são aos teus olhos como o dia de ontem que passou, uma vigília dentro da noite!” Logo em seguida, de acordo com a tradição encontrada em outros textos do Novo Testamento, a carta afirma que a vinda do Senhor será repentina, como a vinda de um ladrão que chega sem dar aviso. Em virtude disso, a nossa vida deve ser de constante vigilância: uma vinda de santidade e piedade, esperando com anseio pela vinda do Senhor; pelos novos céus e pela nova terra, onde habitará a justiça.
A expectativa da vinda futura do Senhor e da nossa vida com Ele em seu Reino é que molda nossa vida cotidiana. Quem não espera nada, vive de qualquer maneira. Contudo, quem espera encontrar-se um dia com o Senhor, quem anseia por estar com Cristo, vive do melhor modo possível, esforçando-se por colocar em prática aquilo o que ouve cotidianamente no Evangelho. Que o tempo do Advento seja fecundo, voltado para a oração e para uma conversão sincera que brota da escuta lúcida e consciente da Palavra do Senhor. Aguardando a sua vinda gloriosa, esforcemo-nos por viver já de modo digno d’Ele, colocando em prática o duplo mandamento do amor: o amor a Deus, com todo nosso coração e o amor ao próximo, como a nós mesmos!
[1] O livro do profeta Isaías costuma ser dividido em três partes: o “Proto-Isaías” – caps. 1-39; o “Dêutero-Isaías” – caps. 40-55 e o “Trito-Isaías” – caps. 56-66.