1ª Leitura: 2Rs 5,14-17
Sl 97
2ª Leitura: 2Tm 2,8-13
Evangelho: Lc 17,11-19
A Palavra de Deus deste domingo, em íntima continuidade com os textos que ouvimos no domingo passado, nos dá o sentido desta nossa celebração. Nós estamos na Eucaristia cristã, dando graças ao Pai, por Cristo, na força do Espírito. A palavra que hoje ouvimos nos relata essa atitude fundamental: a fé que se faz Eucaristia; a fé que produz no coração de quem a recebe uma atitude de ação de graças.
Duas curas, dois pagãos, duas conversões à fé. Na primeira leitura a figura do sírio Naamã, curado da lepra pelo profeta Eliseu, depois de mergulhar sete vezes no Jordão. O quadro é muito semelhante ao que vamos ver no evangelho. Primeiro Naamã demonstra uma certa incredulidade diante da ordem de Eliseu para que ele mergulhasse sete vezes no Jordão. Depois Naamã passa a um certo nível de fé, ainda pagão, em que ele acredita não ter nada a perder obedecendo ao homem de Deus. Por fim, depois de receber o milagre, Naamã se converte à fé israelita e pede a Eliseu para que leve um pouco da terra de Israel, a fim de poder, na Síria, prestar culto ao Deus dos israelitas. O milagre suscita a fé genuína no coração deste pagão, ele volta para agradecer e faz, diante do profeta, a sua profissão de fé: “Agora estou convencido de que não há outro Deus em toda a terra, senão o que há em Israel!” O milagre faz Naamã acreditar no Deus único.
No Evangelho, Lucas nos relata a cura de dez leprosos. A lepra era em Israel não somente uma doença, mas uma impureza ritual. Os leprosos deveriam morar fora do acampamento e estavam excluídos da vida social e religiosa do povo. Ninguém poderia entrar em contato com eles. Eles viviam em pequenas colônias e cuidavam uns dos outros, sem que ninguém pudesse deles se aproximar. A lei era dura a respeito dessas pessoas e tinha como objetivo evitar a contaminação de outros.
Os leprosos sabiam de sua condição e, por isso, ficaram de longe, não se aproximaram de Jesus. Foi à distância que eles gritaram: “Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!” Eles imploraram a compaixão de Cristo como nós fazemos no início de cada Eucaristia: Kyrie, eleison! Jesus, tem misericórdia de nós! E, de fato, eles clamaram à pessoa certa. Jesus não somente tem misericórdia, mas Jesus é a misericórdia.
Enquanto caminhavam, nos diz Lucas, eles ficaram curados. Dez ficaram curados, mas um só voltou, glorificando a Deus e colocou o seu rosto nos pés de Jesus, nos diz o texto grego, fez uma Eucaristia e bendisse a Deus pela cura recebida. E este que voltou era um samaritano. Interessante como os quadros são semelhantes: o da primeira leitura e o do evangelho. Também aqui os leprosos têm um certo gênero de fé, uma fé assemelhada àquela dos pagãos, porque também estes últimos acreditavam que as suas divindades poderiam lhes oferecer cura e bem-estar nesta vida. Todavia, este samaritano (povo rejeitado por Israel, talvez por conta de suas crenças) volta. Ele volta não somente para agradecer o bem recebido, mas ele volta porque o milagre suscitou no seu coração a fé.
Esta palavra nos leva a refletir sobre qual o lugar do milagre na revelação cristã. O milagre acontece para suscitar a fé, senão Deus seria injusto. Muitas vezes nos perguntamos por que Deus não cura a todos, não elimina todas as doenças da face da terra e assim extingue o nosso sofrimento. De fato, Cristo não veio somente para nos garantir uma vida tranquila no plano intramundano. Cristo veio nos oferecer muito mais. Cristo veio nos oferecer a vida bem-aventurada na Jerusalém celeste. A sua entrada no mundo foi para operar este gênero novo e inusitado de salvação. Algo que nós não podíamos imaginar.
Por que, então, o milagre? O milagre acontece para que possamos crer no poder de Deus. Deus intervém na ordem natural das coisas para que possamos entrever a sua grande intervenção na ordem sobrenatural. O milagre acontece para suscitar a nossa fé, e a fé se torna, então, o maior milagre. O grande milagre aqui não foi a cura do sírio Naamã. O grande portento não foi a cura dos dez leprosos. O grande milagre foi que Naamã acreditou que só existe um Deus, Senhor de toda a terra. O grande milagre foi que o leproso aprendeu que somente ao Senhor podemos oferecer o nosso louvor e a nossa ação de graças, porque Ele é o único e verdadeiro Deus. A fé é o grande milagre.
Se a fé é o grande milagre, a ação de graças é a atitude por excelência do homem de fé. É por isso que a Eucaristia é o centro da nossa vida. Tudo brota dela e tudo converge para ela. A Eucaristia é esta fonte e ao mesmo tempo o ponto de convergência de toda a nossa vida cristã. O homem de fé faz a Deus a sua ação de graças, porque teve os seus olhos abertos para reconhecer o grande milagre: Deus ofereceu a sua salvação a todos os homens.
Também nós hoje, conscientes da nossa impureza, paramos à distância e clamamos a Jesus: “Mestre, tem compaixão de nós!” “Jesus, tem misericórdia de nós!” Ele ouve o nosso grito, porque ele não somente tem misericórdia, mas ele é a misericórdia do Pai revelada a nós, feita carne, para que nós a pudéssemos visualizar. Ele nos manda caminhar, e enquanto caminhamos, Ele nos cura, nos purifica. A alguns Ele cura fisicamente, mas a todos Ele cura espiritualmente, porque foi para realizar uma cura sobrenatural que Ele veio: a cura de nossas almas, a cura da ferida original, a cura da nossa incredulidade, a cura da nossa cegueira espiritual. Esta é a grande e verdadeira cura que Ele veio operar. As outras são sacramentos dessa cura fundamental. Que diante desta grande cura de Deus para nós possamos ter o coração agradecido, possamos fazer ao Pai a nossa doxologia, possamos com Cristo fazer ao Pai a nossa Eucaristia, porque Ele nos fez conhecer a sua salvação.