1ª Leitura: 1Rs 19,4-8
Sl 33
2ª Leitura: Ef 4,30 – 5,2
Evangelho: Jo 6,41-51
“Provai e vede quão suave é o Senhor!”
O Domingo é, para nós, símbolo daquele dia “oitavo e último”, dia que é “glória dos dias”, onde somos colocados em contato com o Cristo Mestre, com o Cristo Sacerdote, com o Cristo Diácono Servidor do Pai, através dos ministros que servem o altar de Deus. Por fim, somos gloriosamente tocados pelo Corpo do Senhor, que qual brasa retirada do altar (cf. Is 6,6-7) nos purifica e nos separa a salvação. Este é realmente o “dia que é glória dos dias”!
Nesse dia de festa o Senhor reserva para nós uma palavra, o grande discurso do pão da vida, de João 6, que começamos a ouvir dois domingos atrás. Hoje ouvimos os vv. 41-51, uma seção do discurso que pode ser dividida em duas partes: uma primeira que começa no versículo 41 e vai até o v. 47, introduzida pelas palavras de Jesus: “Eu sou o pão que desceu do céu” e concluída pela promessa: “Em verdade, em verdade vos digo, quem crê, possui a vida eterna”. A segunda parte começa no v. 48 onde Jesus diz: “Eu sou o pão da vida” e termina com uma promessa e num prenúncio: “Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo”.
Essa primeira parte nos relembra algumas passagens do Êxodo (Ex 16; 17), quando os israelitas começaram a murmurar contra Moisés, reclamando ora da falta de alimento, ora da falta de água. Mais do que contra Moisés e Aarão, a murmuração do povo no deserto se configura como uma murmuração contra o próprio Senhor, pois foi Ele que os fez sair do Egito e os guiou através do deserto até entrarem na terra da promessa. Nesse trecho de Jo 6 também os judeus, tendo recebido uma palavra de libertação, a saber, o dito de Jesus “Eu sou o pão que desceu do céu”, começam a murmurar.
Na verdade, a murmuração deles não se dirige, em última análise, contra o Cristo, mas contra o próprio Pai e seu desígnio de salvação, tendo em vista que foi o Pai que enviou o seu Filho para dar a sua vida pela vida do mundo. E assim, os judeus, murmurando contra Cristo e contra o Pai, começam a questionar a origem de Jesus. Eles pensam que o conhecem e se escandalizam com sua origem divina: “Como ele pode dizer que desceu do céu?” (Jo 6,42) Eles conhecem o homem Jesus, mas não o conhecem verdadeiramente, porque Ele é homem-Deus, humano-divino, nasceu da Virgem, mas dela nasceu porque nela se encarnou. Aquele que os céus não podem conter veio habitar no seio da Virgem.
Contra a murmuração dos judeus Jesus afirma mais uma vez a sua origem divina, Ele é aquele do qual se fala no v. 46: “Só aquele que vem de junto de Deus viu o Pai”. Jesus ainda afirma a necessidade da intervenção do Pai para a fé possa ser suscitada no coração do homem: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o atrai.” É o Pai quem nos atrai para o Cristo. O primeiro movimento não é nosso, não se trata de uma iniciativa meramente humana. O primeiro movimento é de Deus, do Pai, Ele é o sedutor, quem nos atrai. Podemos aqui nos lembrar daquelas palavras do profeta Jeremias: Seduziste-me Senhor e me deixei seduzir. Só pode ir a Jesus quem é atraído pelo Pai e, conseqüentemente, quem se deixa atrair.
Mas o Pai nos atrai para quê? Vivemos no meio de duas forças de atração: a do Pai e a do Mundo. O mundo nos atrai para a morte; o pai nos atrai para a vida em abundância, para a ressurreição do último dia, afinal esta é a promessa: “E eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6,40). E como o Pai realiza essa atração: através da sua Palavra. Pela sua Palavra o Pai nos atrai ao Filho. Jesus retoma aqui uma passagem do livro do profeta Jeremias, no cap. 31, o assim chamado “Livro da Consolação de Jeremias”, que diz: “Todos serão ensinados por Deus” (Jo 6,45).
A segunda parte desse trecho de Jo 6 que ouvimos hoje inicia com a afirmação: Eu sou o pão da vida (Jo 6,48). O pão que desceu do céu é o pão que dá vida aos homens. E Jesus relembra aos seus ouvintes a passagem do Maná do deserto (Ex 16). O maná foi o pão de Deus para os homens, mas um pão transitório, um pão que alimentou a vida dos israelitas por um tempo determinado: quarenta anos.
Também o profeta Elias, desanimado pelo cansaço e pelas constantes fugas daqueles que queriam tirar-lhe a vida, foi alimentado por Deus com um pão especial, que o fortaleceu, fazendo-o caminhar ainda por quarenta dias e por quarenta noites até o Horeb, o monte de Deus. Mas o pão que o Cristo nos dá não é um pão transitório, capaz de sustentar a nossa vida apenas por quarenta dias, ou talvez por quarenta anos. O pão que Cristo nos oferece é Ele mesmo, quem d’Ele comer, de acordo com a sua promessa, nunca morrerá.
Se Cristo deu a sua carne para a vida do mundo, nós que recebemos a sua carne e o seu sangue neste divino alimento, devemos também dar a nossa carne, que é sacramento da carne do próprio Cristo, para a vida do mundo. A nossa vida deve ser uma eucaristia, ou seja, uma ação de graças ao Pai, pelo Filho no Espírito Santo. A nossa vida deve ser toda ela doada, ao Pai e aos irmãos, ou melhor, ao Pai pelos irmãos. Os irmãos são os instrumentos através dos quais expressamos o nosso amor a Deus, a nossa entrega a Ele.
Como o profeta Ezequiel, comemos hoje o rolo da Palavra de Deus. Mas que alegria e que grata surpresa! Deus tem reservado para nós ainda mais. Fortalecidos pelo alimento da Palavra, pelo pão da Palavra, receberemos depois o Pão do Sacrifício, o Vinho da Alegria! Levantemo-nos! Eis o convite do anjo (cf. 1Rs 19,7 – primeira leitura). Mas hoje o anjo nos convida a levantarmos não somente o nosso corpo, mas o nosso coração e a nossa mente. Que os nossos corações estejam realmente no alto, em Deus, embora nossos pés ainda estejam nessa terra. Que com os nossos corações em Deus possamos alimentados com a Palavra e com o Pão Eucarístico cantarmos com o salmista: “Provai e vede quão suave é o Senhor!”