Jr 20, 10-13
Sl 68 (69)
Rm 5,12-15
Mt 10,26-33
“Não tenhais medo!”
A Eucaristia deste domingo é, de certa forma, introduzida pelo pedido expresso na oração coleta: “…dai-nos por toda a vida a graça de vos amar e temer, pois nunca cessais de conduzir os que firmais no vosso amor.”
Deus nunca cessa de nos conduzir e, por isso, nós queremos corresponder a esse amor que nos conduz, que nos educa, amor paternal que nos faz caminhar seguros pelas sendas da vida com amor e com temor. Não se trata aqui de medo, mas de “temor reverencial”. Se nos abrirmos ao Espírito Santo Ele há de inflamar de tal modo nossos corações que, tomados por um amor “forte como a morte” (cf. Ct 8,6) seremos capazes desse temor, que nada mais é que reconhecimento da glória de Deus e desejo de honrá-lo eternamente.
É o próprio Deus, a quem queremos “amar e temer” que hoje nos convida no Evangelho: “Não tenhais medo!” Hoje ouvimos um trecho do assim chamado “Discurso Apostólico” de Jesus. Em Mt 10,1-16 Jesus apresenta a missão dos doze; em 10,17-25 Ele adverte os doze a respeito das perseguições que haverão de sofrer; na nossa perícope de hoje ouvimos 10,26-33 que parece unir dois ditos de Jesus:
- 26a: Primeira exortação a não temer
- 26b-27: Os discípulos devem falar abertamente
- 28a: Segunda exortação a não temer
- 28b: Alerta a respeite de quem se deve temer
- 29-30: Cuidado amoroso do Pai com os apóstolos
- 31a: Terceira exortação a não temer
- 31b: Valor dos apóstolos
- 32-33: O testemunho que Jesus há de dar diante do Pai
Os vv. 26-31 se dirigem aos apóstolos. Eles são permeados por três exortações a “não temer”. Os apóstolos não devem temer e, por isso, devem falar abertamente. Eles não devem temer os que matam o corpo, mas sim o que pode destruir o “corpo e a alma”, ou seja, é a Deus que eles devem “temer” (cf. Lc 12,4-5). Eles não devem temer, ainda, porque o Pai cuida deles (…até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados). Os apóstolos não devem temer porque eles valem mais que “muitos pardais”, ou seja, o seu valor diante do Pai é imenso e o Pai que cuida de toda a criação com amor, cuidará ainda com mais amor daqueles que anunciam o seu Reino.
Os versículos finais parecem ser um outro dito incorporado a esta perícope. Aqui Jesus se dirige não mais especificamente aos doze, mas a “todo aquele que”, ou seja, a todo o que ouve a palavra do evangelho e se torna discípulo do Reino, em outras palavras, nós que hoje acolhemos esta Palavra de Deus. Somos também nós convidados a dar testemunho de Cristo. Afinal, seremos um dia julgados. Neste grande dia do juízo final, se tivermos sido testemunhas de Jesus poderemos ter a certeza de termos no tribunal, diante de nós e do Pai, Ele, o Cristo, a “grande testemunha”, que há de vir em nossa defesa.
Esses versículos finais se revestem de certa severidade, mas são, paradoxalmente, uma palavra que estimula a nossa confiança no dia do juízo. Embora caindo e levantando, ou seja, pecando e confessando o nosso pecado, devemos dar sempre testemunho de Cristo. Se assim procedermos poderemos partir dessa vida em paz, porque no tribunal, no dia do juízo, teremos em nosso favor o Cristo, aquele que deu sua vida em nosso resgate. Só de olhá-lo o Pai há de nos introduzir na bem-aventurança, porque o testemunho daquele que deu a vida por nós é mais eloquente que mil palavras. Paulo expressa bem isso na segunda leitura, quando fala da supremacia do sacrifício de Cristo, sacrifício “de um só homem”, que se “derramou em abundância sobre todos”.
Se Jeremias, na primeira leitura, e o salmista, no Salmo 68, puderam expressar a sua absoluta confiança em Deus que lhes faria justiça diante do inimigo terreno, do vil acusador, quanto mais nós, que contamos com o precioso sangue de Cristo, podemos ser confiantes de que o Pai nos absolverá no dia do juízo, se tivermos em nosso favor o testemunho de Cristo, que é maior que qualquer acusação que o maligno possa querer nos fazer naquele dia.